domingo, 9 de agosto de 2015

SAUDADES DAQUELE TEMPO...

Então ela sentiu saudades. Do tempo em que sua maior preocupação era chegar a tempo da escola para ver Malhação ou Chaves. De quando suas lágrimas eram só porque a mãe a mandava tomar banho quando ela ainda queria brincar.

Também sentiu saudades do pai: de quando andava com ele de mãos dadas pelo shopping, pelo clube, pela cidade; de quando ele a jogava na piscina de adultos para ensiná-la a nadar, esperando, ansioso e atento, que ela emergisse sã e salva do fundo; de quando ele foi embora - porque as relações podem ficar muito complicadas mesmo que uma criança não seja capaz de entender - mas não abandonou ela e os irmãos e se manteve presente, ainda que distante, como nenhum outro pai faria.

Sentiu saudades de quando dormia em seus braços deitada no sofá da sala vendo TV e ele a levava para a cama - seu beijo delicado depois de cobri-la; do jeitinho que ele dava para estar presente em todas as formaturas e datas importantes, mesmo morando à muitos quilômetros de distância.

Lamentou por ele não ter caminhado ao seu lado rumo ao altar a fim de entregá-la à união com o homem da sua vida e por esse motivo nunca se casou.

Ela sentiu saudades de quando se vestia de odalisca, bruxa e bailarina para brincar o carnaval.

De quando, nas manhãs de sábado, chamava os irmãos e invadiam o quarto dos pais jogando-se na cama para acordá-los: riso e alegria; e de quando eles se enfiavam todos, os cinco, debaixo do cobertor, juntos e seguros, o mundo inteiro cabendo naquelas quatro paredes.

Também teve saudades de quando aprendeu a ler e escrevia seus primeiros poemas num caderninho colorido que escondia nas gavetas, debaixo das roupas. Depois vieram os diários, a coleção de papéis de carta, o vício de rabiscar até em guardanapos pra não perder o fio de uma ideia.

Sentiu saudades dos disquinhos coloridos que cantavam músicas divertidas nas histórias de sapos, príncipes e princesas - tudo muito encantado. Teve saudades de seus livros de contos de fadas e hoje mata essa saudades relendo-os para a sua princesa.

Sentiu saudades da primeira vez que saiu sozinha com os irmãos mais novos, responsável e orgulhosa.

De quando sentava-se no pátio do colégio, sob as árvores, sozinha, porque um pouco de solidão já se fazia necessário.

Teve saudades das tardes na casa da avó, do bolo de cenoura com calda de chocolate, da macarronada de domingo, do lambari frito, misturinha de nescau, açúcar e água. Sentiu saudades das caminhadas com seu avô.

 Sentiu saudades da faculdade, dos amigos perdidos, dos amores que não deram certo, das pessoas que a amaram e ela não pôde corresponder. Dos sonhos que abandonou porque, muitas vezes, a realidade com suas obrigações e prioridades é mais urgente e não há tempo a perder.

Teve saudades da primeira casa em que morou sozinha quando foi trabalhar longe de casa e das manhãs chuvosas em que ia trabalhar a pé, de guarda-chuvas pensando na vida e fazendo planos para o futuro. Dos "memos" de bom dia trocados com o pai pelo sistema do Banco todos os dias e do primeiro parabéns por telefone ou mensagem às 6 da manhã todos os anos no dia do aniversário.

Sentiu saudades de quando, juntos, iam  à casa das tias e esse era 'o' programa das tardes de sábado. Teve saudades também de quando ele ficou muito doente e cansado, e ela pensou que isso podia durar para sempre, contanto que pudesse mantê-lo vivo.

Ela sentiu saudades de quando dor era apenas sinônimo de tropeçar, cortar o dedo, desembaraçar os cabelos. De quando conseguia dormir sem pesadelos ao seu encalço.

Teve saudades de muita coisa - até do que nem se lembrava mais. E viu que um tanto disso pertencia a uma época em que ela ansiava por crescer.

Agora, descobriu que desejava mesmo nunca ter passado de um metro de altura...

(Esse texto é uma adaptação de um outro texto que li uma vez na internet e até procurei para linkar aqui, pois é lindo e vale a pena, mas não consegui encontrar... uma pena..)




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